O problema dos chatos é que demoram demais. Demoram numa conversa
casual de esquina, demoram ao telefone, demoram a contar um caso, uma
piada, ou a descrever uma cena, demoram a se despedir. Não sabem ir
embora. Têm medo de ficar sozinhos consigo mesmos e se chatear. Sabem do
que são capazes. Como disse o poeta Dylan Thomas: “Alguém está me
enchendo o saco. Acho que sou eu”.
O ponto crucial da nossa relação com o chato é o tempo, o nosso
tempo, que prezamos demais. O chato não tem esse problema, ele despreza o
tempo. Não quer transformar o tempo em dinheiro, mas em conversa, uma
lenta conversa na qual é protagonista. Não há chatos calados. Se um
chato ficasse calado, você não saberia jamais que está diante de um
deles.
Exceção é o chato suspiroso. Conheci um. Falava pouquíssimo, mas
suspirava sem parar, dos suspiros fundos e trêmulos aos que se
confundiam com o ato de expirar, só que se ouviam. Suspiros eram para
ele uma forma de conversa, respondia com suspiros, comentava com
suspiros, concordava com suspiros, alguns tão fundos que pareciam
gemidos. Era como se dissesse que nos poupava o transtorno de contar
suas angústias e as manifestava em suspiros. O último deve ter sido
também de alívio.
Poder-se-ia supor que as pessoas bonitas não chateiam, porque
enfeitam um ambiente. Não é verdade. Chatos não têm encantos, mesmo
quando têm beleza. Conheci um desses, bonito, olhos azuis, algum
dinheiro, mas... Não conseguia que as mulheres ficassem com ele por mais
de uma semana.
Quando é que uma pessoa começa a ficar chata? Como se aprimora? Uma
criança não é chata, no sentido do chato adulto. É chamada de chata por
causa de distúrbios de comportamento, como birra ou turbulência, não por
se alongar explicando uma coisa, ou por seus assuntos serem maçantes.
Nunca são. A gente conhece os chatos já prontos, não em formação. Talvez
houvesse tempo de recuperá-los para o convívio diário e prazeroso, se
fossem identificados prematuramente. Está aí um ramo ainda virgem da
psicologia.
Entre os tipos humanos, o grupo mais intrigante é provavelmente o dos
chatos queridos. Admite-se que são ótimas pessoas, generosas,
prestativas, solidárias, mas a convivência com elas é penosa. Há pessoas
difíceis que não são necessariamente chatas. Os briguentos, por
exemplo, os instáveis, os agressivos, os grilados, os viciados, os
consumistas compulsivos, os maníacos, os mal-habituados, os
autoritários, os ciumentos — todos têm momentos insuportáveis, mas não
são aborrecidos “full time”, não carregam aquele peso que transborda do
chato.
Os chatos queridos ajudam quanto podem a quantos pedem. Podemos
contar com eles. Mas não conseguimos ficar à vontade por muito tempo na
sua companhia; vai surgindo em nós um fino, ínfimo padecimento, que
cresce quanto mais inescapável é a situação. Depois de nos livrarmos
deles, com uma desculpa qualquer, sentimo-nos aliviados, mas levemente
culpados, porque sabemos que são boas pessoas, e só a nossa impaciência
as desmerece. Ao contrário, quando nos livramos dos chatos que não têm
atenuantes, o sentimento é de triunfo, com música de Wagner ao fundo.
Fonte: Veja São Paulo